E enfim estreou Aves de Rapina: Arlequina e sua Emancipação Fantabulosa, conhecido também nas redes sociais como “o filme que ninguém pediu” ou ainda “o filme que está descaracterizando meu vilão preferido”. E que bom que esse tipo de comentário surgiu para provar o quanto os fãs também podem errar e pesar a mão nos comentários (coincidentemente esse tipo de comentário está diretamente ligado a filmes protagonizados por mulheres).
O roteiro de Christina Hodson acerta em cheio ao simplificar a trama de Aves de Rapina, nada como dominação mundial ou seres de outros universos. No longa, Harley Quinn, Renee Montoya, Caçadora e Canário Negro acabam se unindo por acaso da situação, todas com o mesmo objetivo, acabar com o Máscara Negra e proteger a jovem Cassandra Cain do vilão.
Uma mulher usada e abandonada, uma detetive passada para trás no trabalho, uma cantora com trauma de infância pela perda da mãe, uma garota que viu a família ser assassinada diante de seus olhos e uma pequena ladra sem casa e apoio familiar. Aves de Rapina coloca o dedo na ferida da misoginia, do abandono parental e na violência física e emocional contra as mulheres, porém isso é de certa forma abrandado pela forma que é contado (sob o ponto de vista de Harley).
Não bastasse isso, há um dos melhores vilões de quadrinhos entregues até agora. Ewan McGregor é brilhante como Roman Sionis, o Máscara Negra. O ator consegue entregar o típico e canalha vilão dos quadrinhos que deseja construir um império através do tráfico de drogas sem perder a pose de benfeitor da cidade. Vaidoso, traiçoeiro e extremamente sádico, o vilão representa como ninguém a masculinidade tóxica de um homem frágil que precisa a qualquer custo manter sua aparência de badass.
Arlequina e sua emancipação fantabulosa
Margot Robbie parece ter nascido para o papel de Harley, assim como a personagem parece ter sido criada exclusivamente para a atriz. Num daqueles raros casos em que será difícil ver outra atriz interpretando a personagem, Margot entrega toda a fragilidade de uma personagem que por anos foi usada, abusada e deixada na rua como um saco de lixo.
Não se engane, o roteiro não tenta lhe enganar fazendo acreditar que Sr. C (Coringa) abandonou sua parceira pelo simples fato de ser um lunático. Ao ter a história contada sob seu ponto de vista, Harley tenta a todo instante aliviar para seu ex-amado, imputando a si mesma a culpa pelo término. Quantas vezes não vemos situações parecidas no dia a dia, em que as mulheres se culpam pelo término de relacionamento com uma pessoa abusiva?
Se na animação da personagem, é Hera Venenosa que a faz perceber que ela sempre foi usada pelo Coringa, aqui é a necessidade de se manter viva que fornece o insight para que a personagem declare sua emancipação. Irônica e divertida, Harley consegue superar seus traumas emocionais e psicológicos de maneira brilhante, ou se preferir, fantabulosa.
As Aves de Rapina
Não pense que o filme se limita a atuação de Margot Robbie, sua personagem é a condutora de uma história de origem de várias personagens que ainda não haviam ganhado as telas de cinema, mas que brilham por conta própria e deixam o gostinho de “quero mais” logo após os créditos finais.
Mary Elizabeth Winstead está perfeita como Caçadora. A personagem que desde a infância encontra-se numa jornada de vingança pelo que fizeram à sua família é fielmente retratada em relação a sua origem nos quadrinhos, buscando impor o codinome que escolheu em cada passo de sua jornada. É uma sacada interessante como autoafirmação de identidade da vigilante, mas que poderá ter implicâncias futuras para a personagem nos cinemas, afinal não se deixa um rastro de sangue pela cidade sem ser notada por outros vigilantes.
É interessante notar como todas as personagens são bem retratadas no longa, Renee Montoya é outra que tem uma jornada de evolução no longa. De uma mulher desacreditada e passada para trás a integrante de um grupo de vigilantes, mostrando que a personagem buscará pela justiça mesmo que para isso precise abdicar dos meios legais para proteger aqueles que não são notados pela lei.
Mas é Dinah Lance, a Canário Negro de Jurnee Smollett-Bell que se sobressai no longa. Talvez a atriz mais criticada pelos fãs antes do lançamento do longa, provou-se um verdadeiro acerto. Sua Canário traz todas as nuances da personagem, seu talento como cantora, seu senso por justiça e claro, o “Grito da Canário”.
Ver a formação desse grupo nos cinemas é saber reconhecer a audácia do estúdio. A coragem de lançar um longa de heroínas/vigilantes logo após o lançamento de Coringa só seria possível em um estúdio que pode errar a mão em alguns projetos relacionados a DC, mas que não tem medo de ousar e sair da zona de conforto buscando entregar aos fãs uma experiência diferente.
Afinal, heróis, vilões, vigilantes e outros personagens podem ter suas semelhanças, mas são as diferenças entre eles que conquistam a atenção e carinho do público, fazendo com que os fãs se sintam donos desses personagens. O longa escancara as portas para que outras personagens femininas assumam o protagonismo de longas de super-heróis, clamando pela chegada da Hera Venenosa, deixando brecha para a chegada da Batgirl, e consequentemente para o futuro de Cassandra Cain.
Falar que o segmento de filmes de heróis está saturado justamente quando estreia um filme comandando totalmente por mulheres é irônico, ainda mais quando passamos vinte anos assistindo filmes liderados por homens, por sorte as Arlequina e as Aves de Rapina estão aí para combater essa fragilidade masculina, provando que é possível inovar e ver mulheres tão badass como qualquer homem sentando a porrada nos vilões enquanto se preocupa com um lacinho para o cabelo.
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