Tenet foi o blockbuster mais afetado pelo estado de pandemia em que (ainda) nos encontramos. Depois de longos meses de restrições e tentativas de reabertura, os cinemas começam a ser liberados para funcionamento em todo o mundo e é nebuloso afirmar qualquer coisa sobre o momento certo para isso, mas fato é que as cidades têm tomado atitudes no sentido da liberação e esse parece, a princípio, ser um movimento sem volta, de maneira que logo devemos ver novamente o público nos cinemas, ainda que com muitas regras novas. Mas, obviamente, esse retorno pede uma grande estreia, e Tenet está aí pra ocupar esse posto.
O longa traz a história de um protagonista (na verdade, o nome dele nunca é falado, interpretado por John David Washington) que faz parte de uma organização secreta de espionagem, a qual é denominada apenas tenet (sem qualquer detalhe sobre origem ou região de atuação), incumbido de investigar um traficante de armas, o qual está deixando os serviços de inteligência preocupados com a possibilidade de uma nova guerra mundial. Tal preocupação com esse traficante em específico é a criação de uma tecnologia aparentemente exclusiva, que ninguém mais consegue entender ou dominar.
Trata-se da tecnologia de inverter a entropia dos objetos, um conceito da física que pode ser realmente complicado, mas que tem uma explicação bem simples na história: em vez de uma bala, por exemplo, ser atirada, ela volta para o revólver. Como você pode imaginar, a bala é igualmente perigosa em qualquer uma dessas direções, e a grande questão é que não dá pra dizer a diferença entre elas apenas olhando, aliás, muito mais difícil lidar com algo que está em uma linha do tempo reversa, porque você ainda não sabe que ela aconteceu. O protagonista de Tenet tem seu primeiro contato com isso quando ainda trabalhava em uma agência de espionagem, até ser designado para essa missão maior.
Em meio a muitas reviravoltas, teorias e os longos diálogos explicativos (característicos do estilo de direção de Nolan e que aqui até ocupam pouco espaço se comparado aos demais filmes do diretor), os personagens vão descobrindo uma trama que se desenrola aparentemente de forma linear aos nossos olhos, mas, ao montarmos o quebra-cabeças, percebemos que tudo estava longe do alcance de nosso entendimento. É confuso, parece contraditório, às vezes você acha que entendeu e de repente não era nada daquilo, mas mesmo assim você não chega ao fim com a sensação de tempo perdido, pelo contrário: fica curioso pra conseguir apreender o que afinal de contas aconteceu.
É comum em filmes com reviravoltas temporais termos aquela sensação de que algum detalhe passou em branco e perdemos o fio da meada. Aliás, Nolan já é conhecido por filmes nesse estilo, como Amnésia, Insônia e a mega-produção A Origem, mas em Tenet ele supera tudo que já fez e entrega uma história que merece e vale a pena ser vista mais de uma vez. Portanto, uma dica pra você que vai enfrentar as 2 horas e meia de filme: tenha muita atenção aos detalhes (cada movimento e fala dos personagens é importante) e saiba que vai sair do cinema refletindo sobre a história e tentando lembrar de pequenas coisas que poderiam ajudar a entender melhor.
Quanto aos aspectos técnicos de Tenet, a produção não deixa nada a desejar, e os mais de 200 milhões de dólares investidos certamente se tornariam bilhões em bilheteria não fosse a quarentena imposta pelo coronavírus. Os conhecidos efeitos especiais práticos, também uma característica de Nolan, estão lá o tempo todo à nossa frente, e é interessante observar a maneira como ele construiu os mundos real e “invertido” convivendo um com o outro. A técnica de inverter as imagens, fazendo as coisas andarem pra trás, é um recurso até “fácil” de se fazer, mas misturar essas imagens com outras andando pra frente é um desafio, que no fim acabou ficando bem natural e fazendo todo sentido.
Destacam-se também as atuações, pois todos os personagens, de certa forma, se apresentam dúbios e cheios de segundas intenções. Embora eles pareçam todos planos, vão se tornando cada vez mais complexos e os atores souberam extrair o melhor desse texto, de modo que até os coadjuvantes ganham destaque. Aliás, como eles viajam entre diferentes dimensões temporais, não resta dúvida que logo surgirão inúmeras teorias sobre a possibilidade eles não serem exatamente quem aparentam ser.
Tenet, reafirmando, é aquela confusão louca que todos amamos pra ficar fazendo especulações imaginativas numa mesa de bar (ou em uma videoconferência nesses novos tempos). Com uma trama muito consistente e cheio de pontos de discussão, certamente esse filme merecia arrastar multidões aos cinemas. É Nolan, é viagem pura, mas é muito divertido.
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